domingo, 3 de março de 2024

Sobre você, eu e a última carta

Não quero poetizar ou ser dramático, quero apenas deixar registrado enquanto eu lembro. Naturalmente o tempo faz com que esqueçamos cada vez mais, lembremos cada vez menos.

Eu gosto dos detalhes. De todos eles. Gosto de sentir o coração quentinho com as memórias e ao mesmo tempo sinto uma angústia profunda. É, nem tudo foi bom.

Se existisse uma balança do relacionamento que tivemos, eu acredito que o lado bom foi mais intenso e gostoso. 

Eu te enxergava como um homem com cara e jeito de homem. As vezes você lembrava meu avô, poucas palavras, meio rabugento, mas chegava junto se precisasse. Já eu? Falava mais que os cotovelos.

Você topava tudo, lembra? Eu lembro! E eu amava te levar em qualquer cantinho que meu coração fez morada. Nem sempre você gostava, mas você topava.

Lembro da nossa primeira vez em Recife. Era também nossa primeira viagem de casal.  Janeiro de 2017. Minhas férias. Lançamento do novo album da Pabllo. Já nos desentendemos na ida por você ter esquecido seu RG em casa. Conseguimos embarcar. Logo que chegamos, tivemos uma briga feia no hotel. Pensamos em voltar pra casa antes do término da viagem, mas nos acertamos. Fomos rodar a cidade. Você amou tudo, lembra? Sinto que Recife tem muito a ver com a nossa história. De lá até o final, fizemos inúmeros planos de nos mudar para aquela cidade. Será que teria sido diferente lá?

Quando começou a dar ruim, a gente se machucava muito, mas depois nos acertávamos e vivíamos os próximos dias numa intensidade maluca de amor.

Era um amor maluco.

Você não gostava de dormir no canto da parede e adaptamos a cama por isso. Você gostava de café preto, mas as vezes aceitava misturar com leite. Você pouco dizia que me amava, mas eu sabia, mesmo sem você dizer muito, que eu era o homem da sua vida, assim como você era da minha. 

Era um amor louco.

Acho que te fiz mal. Acho que nos fizemos mal. Mas, poxa… também nós fizemos tão bem. Lembro de uma vez que tive febre, você colocou um monte de toalha molhada no meu peito e ficava enviando mensagem para Diego pedindo ajuda.

Era um amor cuidadoso.

E aí, eu penso: Como pode um amor tão intenso, a vontade de cuidar um do outro, as juras de amor eterno e os planos que tínhamos, terem indo embora assim?

A gente não nasce sabendo. E nós… sabíamos muito menos. Mas nos entendíamos dentro daquele *caos*. Eu cheguei a pensar que o sentimento era doentio, pq por mais que eu me sentisse mal, eu ainda continuava querendo você.

Eu te chamava de painho. Nós riamos. Até que virou rotina, só nos chamávamos assim.

As vezes eu odiava tanto seu jeito que chorava de desgosto profundo. Eu tentei te mudar, mesmo sabendo que não se muda o que as pessoas são, mas eu queria que você tivesse sido diferente em muitos momentos. Eu queria ter sido diferente também.

Quando começou a piorar tudo, você sugeriu terapia de casal, eu achava que a individual era melhor. Não fizemos. Mas podíamos ter tentado.

Eu saí do nosso relacionamento te procurando em cada esquina, em cada viagem, em cada boca e corpo de outras pessoas. 

Eu queria ter tido mais coragem.

Quando eu falava em voltar contigo, todo o mundo se colocava contra e eu me acovardava. Eu queria ter passado por cima de tudo pq só eu sabia o que eu sentia, mas fui covarde… ou corajoso. E aí fui alimentando um sentimento de frustração pq nunca vou saber o que poderia ter acontecido. Voltaríamos e viveríamos felizes para sempre? Não, né? Mas muita coisa poderia ter melhorado. Prefiro acreditar assim. 

Da última vez que te encontrei, eu chorei na sua frente, falei como a vida andava ruim, comentei sobre o término de um casal de amigos. Você foi seco. Duro. E naquele momento vivi um filme na cabeça do quanto você pode ser essa rocha inquebrável e aquilo me quebrou por dentro. Doeu por ter chegado a um ponto de entendimento que ali era realmente nosso fim. 

Eu demorei a fazer as pazes comigo mesmo. Só consegui fechar esse ciclo quando reuni as pessoas que eram importantes para mim e assumi minhas partes podres, comentei sobre as minhas insanidades e o quanto também fui tóxico para você. Eu coloquei muita culpa em cima de você para que eu saísse ileso no final da história e aí tempos depois percebi o quanto fui injusto. Não cabe recurso ou pedido de desculpas. “Mal feito, feito.”

No final, a única certeza que tenho é a que te amei da forma que nunca serei capaz de amar ninguém. Eu cresci contigo. Eu descobri a vida contigo. Eu conheci o melhor e o pior do amor ao seu lado. E me sinto sortudo por ter feito parte da sua história.

Afinal, éramos dois, eu e você, vítimas do insensato prazer.

Lee